Vida errabunda, somos os goliardos

Adoramos a boa vida
Monges beberrões inveterados
Pelo Papa amaldiçoados
Ah, nós somos os goliardos
Sim somos alegres bonachões
Os bardos enamorados

Somos soltos pelo mundo
Como o vento que sopra
Na vastidão das campinas
E de nossas bocas é a obra
Que multiplica os hereges
Que as puras moças soçobra

Monges loucos menestréis
Ah, nós somos os goliardos
E aos ricos que aqui passam
Pedimos alguns trocados
Para jarras de bom vinho
E mulheres do pecado

Nesta vida errabunda
Somos monges mendicantes
Os pobres anjos malditos
Por isso temos amantes
Por qualquer feira e lugar
Somos os monges cantantes.
(JFN)
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Errabundus - no português ficaria errabundo - era o nome que se dava na aos errantes vagabundos e vadios (os poetas de taverna inclusos!). Na Idade Média (Século XIII), esses poetas errabundos receberam do Papa a denominação do "goliardos" - uns monges-demônios, simpáticos beberrões, que erravam pela Europa falando mal de quem tinha poder: reis, nobres, juízes e a própria Igreja e destacando o amor terreno e carnal. As Canções de Burana, ou Carmina Burana, são exemplos do que esses monges escreviam e cantavam.
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O Fortuna

Nosso velho, porém atualíssimo, Nicolau Maquiavel deveria ser lido por todo político que tem juízo - coisa talvez rara ou talvez inexistente. Ele dizia que o destino dos homens dependia basicamente de duas coisas: virtu et fortuna (virtude e sorte). Sobre a Fortuna, que também era a denominação da deusa romana que determina a sorte dos homens, temos estes versos de anônimos monges, os goliardos, musicados por Carl Orff, que vão aqui traduzidos do nosso não menos velho latim medieval:

O Fortuna, --- Ó Fortuna,
velut luna --- És como a lua
statu variabilis, --- Mutável,
semper crescis --- Sempre aumentas
aut decrescis; --- Ou diminuis;
vita detestabilis --- A detestável vida
nunc obdurat --- Ora oprime
et tunc curat --- E ora cura
ludo mentis aciem, --- Para brincar com a mente;
egestatem, --- Miséria,
potestatem --- Poder,
dissolvit ut glaciem. --- Ela os funde como gelo.
Sors immanis --- Sorte monstruosa
et inanis, --- E vazia,
rota tu volubilis --- Tu, roda volúvel
status malus, --- És má,
vana salus --- Vã é a felicidade
semper dissolubilis, --- Sempre dissolúvel,
obumbrata --- Nebulosa
et velata --- E velada
michi quoque niteris;--- Também a mim contagias;
nunc per ludum --- Agora por brincadeira
dorsum nudum --- O dorso nu
fero tui sceleris. --- Entrego à tua perversidade.

Sors salutis --- A sorte na saúde
et virtutis --- E virtude
michi nunc contraria --- Agora me é contrária.
est affectus --- Dá
et defectus --- E tira
semper in angaria. --- Mantendo sempre escravizado
hac in hora --- Nesta hora
sine mora --- Sem demora
cordum pulsum tangite; --- Tange a corda vibrante;
quod per sortem --- Porque a sorte
sternit fortem, --- Abate o forte,
mecum omnes plangite! --- Chorai todos comigo!
Ouça "O Fortuna" - abertura e encerramento de "Carmina Burana"

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